quinta-feira, setembro 16, 2004

Lisboa

Lisboa é uma cidade lindíssima! Por várias razões. Antes de mais pela dimensão. A baixa pombalina é geometricamente ampla e organizada, facto que impressiona logo à chegada. Depois, está recheada de locais pitorescos como o Bairro Alto (saudades dessas noites), Alfama, ..., que lhe emprestam um charme muito especial. Quase contraditoriamente, é uma cidade cosmopolita (talvez mesmo a única em Portugal), repleta de excêntricos, de culturas, credos e raças. Não menos importante para o quadro é a beleza que a luz, quente e intensa – diferente, por exemplo, da do norte – empresta às paisagens e monumentais edifícios dispersos pela capital.

Não obstante toda esta beleza, de certa forma avassaladora, enquanto lá vivi sempre senti um estranho vazio. Não era só a distância de casa. Era mais que isso... Provavelmente, alguns dos que já lá viveram (ou vivem) tiveram a mesma sensação. Não que me sentisse desintegrado, mas a verdade é que também nunca me senti completamente integrado ou acolhido. Uma espécie de pertencer àquele espaço e tempo, sem nunca fazer totalmente parte de tudo aquilo.

O que vos trago agora é mais um excerto d' «O Último Cabalista de Lisboa» de Richard Zimler. Não obstante tudo o que me separa da acção deste romance histórico e do contexto destas duas jovens personagens (um judeu convertido e um muçulmano mudo, Lisboa, 1506), foram vários os momentos em que me identifiquei com o que diziam ou pensavam. Assim, enquanto olhava a paisagem, diz subitamente Farid (o jovem muçulmano):
"- É largo de mais - comentam os seus gestos.
- O quê? – pergunto. [Berequias, o jovem judeu convertido]
- O rio. Devíamos poder ver o outro lado. Como em Tavira ou Coimbra. Mesmo o Porto. Aqui não há intimidade. Não podemos abraçar esta cidade. A amplidão do rio faz-nos sentir que apenas estamos de visita. Que somos todos insignificantes. É a maldição desta cidade."
«O Último Cabalista de Lisboa», Richard Zimler, Quetzal Editores

2 Comentários:

Às 6:23 da tarde , Blogger Maria disse...

eis uma janela bem aberta a da sua visão sobre estas 2 cidades magníficas...e genial o excerto desse livro que tive a sorte de encontrar no meu caminho. Sou "alfacinha" pura (Alfama)mas sinto amiude o chamamento do Porto...amigos/locais/momentos que me fazem voltar sempre de vontade renovada....Farid falou e disse!
Mas há coisas que têm uma razão..nós, os Lisboetas (excepto as gerações mais novas) herdámos a condição de órfãos de "terra" dos nossos pais. No Porto...há famílias estabelecidas de alma e geografia centenárias...como as árvores perenes e as águas dos rios...em Lisboa, somos arbustos podados que não logram fundar raízes. E também isso se reflecte no calor das almas e na bondade dos olhares. Adoro a minha cidade, mas gostaria de ter uma terra aonde ir...

 
Às 11:47 da tarde , Blogger Lino Gomes disse...

Belo pensamento Maria, estou de acordo com o contributo geracional a que se refere

 

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