quinta-feira, setembro 09, 2004

Falsa modéstia e presunção

Desde muito cedo que me dei conta da existência de várias formas de lidarmos com as nossas qualidades e com os nossos defeitos. Há partida, muitos dirão ser mais fácil lidar com as primeiras do que com os últimos. Eu discordo!
Penso que existem vários "grupos-tipo" de pessoas no que diz respeito à forma como lidam com as suas qualidades.
Alguns deles são simples de imaginar e não levantam grandes questões: os verdadeiramente modestos e os verdadeiramente presunçosos. Estes dois grupos não oferecem, geralmente, grandes dificuldades: são fáceis de identificar (todos já devem ter alguns exemplos na cabeça) e, quer com um quer com outro grupo, acaba por ser fácil lidar ao fim de algum tempo.
Depois existe aquilo a que eu chamaria o grupo dos realistas. Quer aqueles que acham não são particularmente dotados sob um qualquer ponto de vista, quer aqueles que têm plena consciência de que têm um trunfo forte numa área e não se coíbem de o usar ou exibir. É para estes últimos que as coisas se complicam. Existe uma espécie de "barreira invisível" entre ter consciência das suas capacidades e tornar-se presunçoso e arrogante quanto a elas. Na minha opinião, o risco de pisarem a dita linha é tanto maior quanto maior for a discrepância entre a forma como estas pessoas se vêem a si próprias e a forma como a maioria dos outros o vêem a si.
Deixo para o fim o grupo que, pessoalmente, mais irrita. Trata-se dos falsos modestos. A meu ver, caracterizam-se por uma postura ridícula de negação daquilo que é óbvio e por uma relação perigosa com as suas qualidades. Geralmente, fazem questão de se assumirem como inofensivos e de se afirmarem vulgares quando na verdade, e no seu intimo, se julgam verdadeiros génios, belezas divinas, ... ou outras sumidades dependendo da característica em causa. Muitas vezes esta máscara cai quando alguém que eles julgam "inferiores" desafia a sua interior certeza de serem "bons". Quando escrevia há pouco que, se caracterizavam por uma postura ridícula talvez não tenha sido claro no que pretendia dizer. Anda por perto de uma situação em que nos encontramos com a Catarina Furtado e dizemos "Realmente, és bastante atraente!", ao que ela (se for uma falsa-modesta) responderia "Ai! Não! Sou uma mulher normal, até tenho aqui um pé de galinha no olho esquerdo!". Esta fórmula podia ser aplicada a uma pessoa notoriamente inteligente ou a alguém extremamente dotado para o desporto.
Este último grupo é, de facto, aquele com o qual me custa bastante relacionar: cansam-me e "enjoam-me" ao fim de algum tempo.
A máxima "mil vezes convencido a falso-modesto" é algo que eu acho fazer algum sentido. Numa sociedade, tantas vezes medíocre, em que quase que é preciso pedir desculpas por ser bom numa qualquer área, pode não ser fácil usá-la. Dos convencidos, pelo menos, todos sabem o que esperar.

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